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quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Atraso na entrega de imóvel pela construtora: Quais os direitos do comprador?


A aquisição de imóveis em construção é algo que desperta o interesse de muitos consumidores e investidores pela possibilidade de aquisição por preços vantajosos em relação a valorização dos imóveis prontos, bem como pela possibilidade de pagamentos diretamente a construtora durante o andamento das obras. Estas e outras vantagens tem fomentado diariamente o mercado imobiliário.

Porém, nem tudo são flores. A aquisição de unidades em construção também envolve riscos. Há casos em que o sonho da casa própria ou até mesmo do lucro esperado pelos investidores se transformam em dores de cabeça para os envolvidos na relação comercial. A exemplo de inúmeros problemas que possam advir deste negócio imobiliário, tem-se o atraso na entrega do imóvel por culpa da construtora.

Quando da assinatura da promessa de compra e venda o promissário comprador já sai com a expectativa do recebimento das chaves da unidade adquirida na data ajustada no contrato.

É comum que além do prazo previsto para entrega da unidade, se ajuste no contato um prazo de tolerância para resguardar a construtora de determinados imprevisto, o qual é frequentemente acertado em 180 dias. Há inúmeros julgados que chancelam a possibilidade de se ajustar um prazo de carência para a entrega do imóvel, sendo o prazo de 180 dias o atualmente admitido como tolerável, devendo-se em qualquer caso notificar o comprador sobre o atraso. (STJ, REsp 1582318-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva - Terceira Turma, j. 21/09/2017.

No entanto, não é incomum que o prazo de carência fixado no contrato seja também descumprido por parte da construtora, permanecendo aquela em mora enquanto não realizar a efetiva entrega da unidade autônoma ao comprador.

Diante desse descumprimento contratual, há duas saídas que podem ser tomadas pelo consumidor: (a) exigir o cumprimento do contrato; ou (b) requerer a rescisão do contrato, mediante a restituição do valor pago a construtora devidamente atualizado. Em ambas as hipóteses também se mostra possível buscar a cobrança de eventuais multas contratuais, lucros cessantes pela não fruição do bem e pagamento de indenização por danos morais a depender do caso concreto.

Vejamos detidamente cada possibilidade.

Ambas as opções disponíveis ao consumidor remetem ao art. 475 do Código Civil ao prever que “Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos”.

Se optar por exigir o cumprimento do contrato judicialmente, o juiz fixará prazo para cumprimento da obrigação pelo devedor (no caso a construtora), sob pena de multa. Além da aplicação de multa, entende-se possível pleitear em face da construtora as multas de mora eventualmente previstas em contrato, bem como o pagamento de aluguel pelo prazo em que o adquirente ficar impossibilidade de usufruir do imóvel. Nesse sentido, o STJ entendeu que "O descumprimento do prazo para entrega do imóvel objeto de compromisso de compra e venda viabiliza a condenação por lucros cessantes, havendo presunção de prejuízo do promitente comprador" (STJ, AgInt no AREsp n. 887148/SP, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 9-8-2016).

E por entrega do imóvel, entende-se a efetiva entrega das chaves por parte da construtora e não apenas a expedição do habite-se ou instituição de condomínio. Por óbvio, a ausência destes, também não pode ser interpretada como cumprimento da obrigação, a exemplo de se promover a entrega das chaves em condomínio irregular, sem habite-se, haja vista que do mesmo modo o comprador não poderá dispor do imóvel livremente, tal como aliená-lo a terceiros (caso dos investidores).

Nos termos do artigo 44, caput, da Lei 4.591/64, após a concessão do habite-se pela autoridade administrativa, compete ao incorporador requerer"a averbação da construção das edificações, para efeito de individualização e discriminação das unidades, respondendo perante os adquirentes pelas perdas e danos que resultem da demora no cumprimento dessa obrigação".

O Tribunal do Distrito Federal, por sua vez, desenvolveu a tese jurídica de que “O termo inicial dos lucros cessantes deve ser um dia após a data de previsão de entrega da obra acrescida do prazo de tolerância de 180 dias (...). Com relação ao termo final, o entendimento que se consolida neste eg. TJDFT é no sentido de que o termo final da mora da construtora, empreendedora, vendedora e/ou incorporadora, quando se tratar de imóvel a ter o saldo devedor financiado por instituição financeira, que não a própria construtora, não corresponde à data da efetiva entrega das chaves ou da expedição da Carta do Habite-se, mas à data da averbação desta no registro de imóveis, porquanto somente após esse procedimento é que se torna possível o financiamento bancário, com o fim de quitação do saldo devedor. (gn)"Acórdão 926775 (grifos no original).

O valor do aluguel a ser pago pela construtora pode ser obtido pela comparação da locação de imóveis similares na região, bem como há julgados que fixam o valor do aluguel em 0,5% do valor do imóvel à época da mora. Nesse sentido:

A não fruição do imóvel pelo promissário comprador enquanto perdurou a impontualidade da promissária vendedora configura lucros cessantes passiveis de indenização, cujo montante deve corresponder a 0,5% do valor do imóvel à época da mora, segundo entendimento jurisprudencial (TJMG - Apelação Cível 1.0145.14.013209-6/001, Relator (a): Des.(a) Leite Praça , 17ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 31/03/2016, publicação da sumula em 12/04/2016).
Por outro lado, se o consumidor preferir a rescisão do contrato – o que em determinados casos é a única alternativa – deverá ser lhe restituído, de uma só vez, o valor pago a construtora, acrescido de perdas e danos pela inexecução contratual, também sendo devido o pagamento de aluguéis pela não fruição do bem.

Deve-se ainda antes de pleitear a resolução do contrato avaliar detidamente os riscos envolvidos, bem como a questão financeira envolvida na negociação, uma vez que a depender do período de atraso o valor eventualmente pleiteado a título de lucros cessantes pode nem mesmo cobrir a valorização do imóvel tida durante o período em que o comprador aguardou a entregada da obra. Ou seja, a manutenção do contrato, se possível, pode ser ainda assim mais vantajosa ao comprador.

Independente do meio adotado, não se pode esquecer que a posterior entrega da unidade fora do prazo não exime a construtora da responsabilidade de indenizar o adquirente pelo período de inadimplemento contratual. Ou seja, mesmo que requerido o cumprimento do contrato e durante o curso do processo a construtora realize a efetive entrega das chaves da unidade tal fato não afasta a indenização por lucros cessantes acima estudada. Uma coisa não depende da outra, são fatores distintos.

Necessário pontuar, por fim, que eventuais justificativas pelo atraso da entrega do imóvel que se referiram a fatores previsíveis e inerentes ao negócio não são admitidas para isentar a construtora de sua responsabilidade, tais como alagações de falta de mão de obra, materiais, entraves burocráticos ou chuvas excessivas, já que não são consideradas como excludentes de culpabilidade.

Assim, diante da inexecução do contrato por culpa da construtora cabe ao comprador a possibilidade de requerer o cumprimento da obrigação (entrega das chaves) ou requerer a rescisão do contrato mediante a devolução dos valores pagos, possibilitando, em ambos os casos, pleitear também o pagamento de perdas e danos e lucros cessantes consistente no valor de alugueis do imóvel equiparado pela não fruição da unidade adquirida enquanto durar a inexecução do contrato.